Crianças e adolescentes vítimas de violência sexual têm acolhimento garantido em Alagoas
M.C.S. recebe atendimento na Área Lilás do HM há nove meses Carla Cleto Texto de João Victor Barroso |
Proteger crianças e adolescentes é um dever da família, da
sociedade e do poder público, como está expresso na Constituição Federal
e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Mas, a cada hora, três
crianças ou adolescentes são abusados no Brasil e, 80% dos casos,
acontecem dentro de casa, segundo dados do Ministério da Mulher, da
Família e dos Direitos Humanos, divulgados e 2020.
Essa situação
trágica foi vivida por M.C.S., uma menina de apenas 12 anos, abandonada
pela mãe e com paralisia cerebral. A criança morava com a avó, no
município de Porto de Pedras, Litoral Norte de Alagoas, e foi a tia avó,
que mora em Maceió, que durante uma visita à criança, percebeu algo
estranho na região genital da menina, na hora de trocar a fralda.
“Vimos
que tinha alguma coisa errada, avisamos para a minha irmã, avó de
M.C.S., para ela levar a menina no médico para uma consulta. Minha irmã
disse que a levou até uma Unidade Básica de Saúde (UBS) de Porto de
Pedras, e falou que não tinha nada de errado com a criança”, recorda a
tia avó.
Entretanto, depois de um tempo, ela disse ter voltado
para visitar a sobrinha neta e percebeu que o quadro continuava o mesmo.
“Na mesma hora a levamos para a UBS e o médico suspeitou que a criança
estivesse com HPV. Por se tratar de uma criança, suspostamente
violentada sexualmente, ele acionou o Conselho Tutelar”, contou a tia
avó.
Área Lilás – Os conselheiros tutelares
levaram M.C.S. até a Área Lilás do Hospital da Mulher (HM), situado no
bairro Poço, em Maceió, que é principal porta de entrada da Rede de
Atenção às Vítimas de Violência Sexual (RAVVS), em Alagoas. Ao chegar à
unidade, a criança foi acolhida pela equipe multidisciplinar, sendo
atendida por médicos, psicólogos, assistentes sociais e enfermeiras.
A
tia avó conta que a menina chegou em Maceió em uma situação crítica,
muito magra e com os músculos enrijecidos. Ela ainda fala que o primeiro
contato de M.C.S. foi com uma pediatra, uma ginecologista e uma
psiquiatra. Após diversos exames feitos na unidade, veio a confirmação
da infecção pelo HPV, e de que a criança também havia sido estuprada.
“Suspeitamos
que tenha sido o esposo da avó dela que fez isso, porque ele ficava
durante dias sozinho com a menina, dava banho, trocava fralda, e dormiam
na mesma cama, era ele para tudo. Mas agora M.C.S. está sendo muito bem
cuidada pela bisavó, e por todos da minha família”, relatou a tia avó.
Ela
conta que a sobrinha neta já está há nove meses em tratamento na RAVVS e
tem sido excelente para o desenvolvimento dela. “Hoje ela é outra
criança, não tem mais um olhar triste que carregava e, fisicamente,
evoluiu muito, de um jeito que a gente não imaginava. Antes ela não
falava nada e agora já consegue se comunicar dentro das limitações que a
paralisia cerebral permite”, contou a tia avó.
M.C.S. continua
com os atendimentos e acompanhamento psicológico da equipe da RAVVS, que
pela dificuldade de locomoção da paciente, disponibiliza um carro para
buscar e levar a menina para as consultas. Além do apoio clínico, a
RAVVS também está dando suporte jurídico para a tia avó, que busca na
justiça ter a guarda da menina.
A RAVVS – O
trabalho desenvolvido pela RAVVS é feito por médicos, enfermeiros,
psicólogos, assistentes sociais, médico perito e agente da Polícia
Civil. A equipe multidisciplinar também conta com o apoio de uma rede
intersetorial composta por órgãos da segurança pública, da Justiça,
conselhos tutelares, Secretaria de Estado da Prevenção à Violência
(Seprev), da Educação (Seduc), da Assistência Social (Seads), da Mulher e
dos Direitos Humanos (Semudh).
Para Camille Wanderley, psicóloga
e coordenadora da RAVVS, a campanha Maio Laranja vem alertar toda a
população sobre os impactos que a violência sexual desencadeia no
público infanto-juvenil. “O mês de maio e esta terça-feira [18], Dia
Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e
Adolescentes, é o momento importante para convocar toda a sociedade a
participar do combate e enfrentamento à exploração e violência sexual.
Também é uma oportunidade para discutirmos as sequelas, uma vez que esse
tipo de violência causa grandes impactos no desenvolvimento da criança,
refletindo-se na vida adulta”, salienta a psicóloga.
Os serviços
da RAVVS funcionam desde 2018 e, além da Área Lilás do HM, as vítimas
podem procurar atendimento na pediatria do Hospital Geral do Estado
(HGE), em Maceió; no Hospital Ib Gatto Falcão, em Rio Largo; e no
Hospital de Emergência do Agreste (HEA), em Arapiraca.
Dados
assustadores - Crianças e adolescentes entre 0 e 17 anos estão entre as
principais vítimas da violência sexual atendidas pela RAVVS. Somente em
2021, nos quatro primeiros meses do ano, a equipe da Área Lilás do
Hospital da Mulher antedeu 250 pacientes e, desse total, 172 foi do
público infanto-juvenil, o que representa 68,8% do atendimento anual.
“Desde
outubro de 2018 estamos desenvolvendo uma política pública voltada para
uma assistência qualificada, humanizada, acolhendo as vítimas com
sigilo, conforto e dando o apoio necessário para todos os pacientes”,
destacou Camille Wanderley.
Quando as vítimas de violência sexual
procuram a RAVVS, elas passam por exames como o beta HCG, para a o
diagnóstico de gravidez, um hemograma completo e testes rápidos para
HIV, sífilis e hepatites. Os pacientes também tomam medicamentos
profiláticos, como o antirretroviral para uma possível infecção pelo HIV
e fazem uso da pílula do dia seguinte.
Denunciando casos de violência sexual
– A população pode denunciar os casos de exploração e violência sexual
indo na Área Lilás do Hospital da Mulher, por meio dos números (82)
3315-1393, (82) 98882-9765, pelo 180 ou pelo Disque 100, que funcionam
durante 24 horas por dia.
A coordenadora da RAVVS reforça que a
população não precisa ter medo em denunciar e que as denúncias também
podem ser feitas por meio do aplicativo Fica Bem, desenvolvido em 2020
pela Sesau, em parceria com o Centro Universitário Cesmac, e que está
disponível na PlayStore para aparelhos celulares com o sistema
operacional Android.
“Ninguém precisa ficar temeroso em fazer uma
denúncia, pois todo o processo acontece em sigilo, preservando a
identidade de quem está denunciando. O aplicativo surgiu pela diminuição
das denúncias de violência sexual durante o período mais crítico da
pandemia”, disse.
Por Agência Alagoas
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