Novembro Negro: histórias de luta e resistência contadas por quatro alagoanos
Imagem TV Pajuçara |
129 anos se passaram desde que negros e brancos
passaram a ser, oficialmente, cidadãos com direitos iguais. O fim da
escravidão foi um marco na história do Brasil a partir do qual
brasileiros de raças e cores distintas trilhariam caminhos convergentes,
até o dia em que chegariam a um ponto comum: a igualdade de
oportunidades e de reconhecimento, o respeito e garantia dos direitos, o
acesso aos serviços públicos, à Justiça, ao emprego, à segurança.
Mas em 2016, institutos nacionais de pesquisa
revelam que, ao contrário disso, negros e brancos seguem em direções
opostas. A violência entre mulheres negras, por exemplo, cresceu 54,2%
entre 2004 e 2014, enquanto entre as brancas diminuiu 9,8%. Os dados são
do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
No mercado de trabalho, a distorção também é
eminente, e pode ser percebida na remuneração dos profissionais. Uma
pesquisa feita em 2015 em São Paulo mostrou que negros recebem 32% menos
que brancos. Os números são da Pesquisa de Emprego e Desemprego do
Dieese e Fundação Seade.
Driblar as estatísticas, enfrentar o preconceito e
conquistar espaços na sociedade que historicamente foram ocupados por
brancos é um desafio, ainda no século 21. Mas foi assim, remando contra
marés, que estas quatro personalidades, escolhidas pelo TNH1, TV Pajuçara e Rádio Pajuçara, para representar a Consciência Negra, conseguiram destaque nas atividades que se propuseram a exercer.
Na música, no meio acadêmico, na moda ou na dança,
Igbonan Rocha, José Vieira, Ádija Rocha e Mara Carolina fizeram e fazem a
diferença, e mostram ao Brasil de negros, brancos, pardos, índios,
amarelos, miscigenados, o quanto ainda falta trilhar para um ponto de
igualdade, distante, sim, mas possível e palpável. Com suas histórias de
vida, eles dão lições sobre a consciência e o orgulho de ser negro.
“Sempre havia um segurança me seguindo”
Músico, natural de Salvador (BA), Igbonan Rocha
chegou há 30 anos em Maceió, e por aqui está até hoje. Considera a
cidade o melhor lugar do mundo para se morar. Mas antes de se tornar uma
pessoa conhecida no cenário da música local, precisou enfrentar
diferentes situações de preconceito.
Ele relata uma situação que era corriqueira em seu
dia a dia: “Toda vez que ia a uma loja, me sentia muito seguro”,
ironiza. “Sempre havia um segurança me seguindo. O tempo todo”, conta.
Igbonan lamenta que “o negro alagoano ainda não se assuma como tal”, e
diz que isso acontece em virtude de fatores históricos, como o episódio
conhecido como Quebra de Xangô ocorrido em Maceió, em 1912, que ainda
precisa ser superado e enfrentado.
Sobram vagas destinadas a negros na Ufal; clique e assista
Recentemente eleito vice-reitor da Universidade
Federal de Alagoas (Ufal) e primeiro negro a ocupar o cargo, o professor
José Vieira vê sua eleição como um marco na instituição. Das 128
universidades federais do país, apenas 3 têm reitor ou vice-reitor
negro. Em sintonia com essa conquista, a Ufal é a terceira do país a
adotar ações afirmativas, programa que, além das políticas de cotas, tem
como objetivo engajar e dar maior valorização aos alunos pretos e
pardos.
“Com as ações afirmativas não vamos resolver todos
os problemas que envolvem essa questão no nosso Estado, mas é mais um
incentivo para diminuir a desigualdade racial que ainda existe na
Universidade”, destaca o professor.
José Vieira revela, porém, que o negro ainda precisa
ocupar seu espaço na universidade e cita: “Dos 20% de cotas do curso de
Medicina destinadas a pessoas negras, apenas 15% são ocupadas”.
Modelo negra era “cota” das campanhas publicitárias
Uma das primeiras negras a ingressar no cenário da
moda em Alagoas, Ádija Rocha lembra que, ao ser convidada a trabalhar
como modelo, se sentiu, no início da carreira, aos 18 anos, como se
fosse a “cota” das campanhas publicitárias. Nos últimos anos, no
entanto, ela percebe que mulheres pretas e pardas estão tendo cada vez
mais espaço dentro das agências.
“No início, só existia eu de negra na produtora, e
hoje há bem mais meninas. O mercado tem uma exigência maior pelo nosso
perfil. Mas, sobretudo, a conquista recente de uma negra no concurso
Miss Brasil nos valorizou de um modo muito significativo no cenário da
publicidade”, expressa.
“É preciso construir a identidade do negro”
Formada em Letras, a professora Mara Carolina
realiza um trabalho junto ao Coletivo AfroCaeté, grupo alagoano que
busca por meio da música a valorização das riquezas culturais e dos
povos do Estado. Mara conta que, além do projeto, procura sempre
discutir a temática da “negritude” em sala de aula e observa que, em 12
anos de profissão, já vê uma expressiva mudança na postura dos alunos
acerca do assunto.
“É preciso construir a identidade do negro que, por
vezes, é negada no nosso país. É negado o direito de afirmar que é negro
quando chamamos alguém por ‘moreninho’, por exemplo. Assim, os
movimentos negros, sociais, culturais surgem para dizer o contrário
deste pensamento. As pessoas precisam entender que também fazem parte
dessa cultura”, expõe.
Por TNH1
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