Em Alagoas, atendentes de serviços de emergência sofrem com trotes e agressões verbais
Policiais militares e bombeiros que trabalham no Ciosp alertam que os trotes podem ser o limite entre a vida e a morte Ascom |
Os atendentes dos números 190, da Polícia Militar de Alagoas
(PMAL), e 193, do Corpo de Bombeiros Militar de Alagoas (CBMAL) costumam
ouvir mais de 2.500 ligações diárias no Centro Integrado Operacional de
Segurança Pública (Ciosp) da Secretaria de Estado da Segurança Pública.
A maioria absoluta dos telefonemas, porém, acaba sendo classificada
como trotes e falsos pedidos de socorro e muitos terminam com agressões
verbais proferidas contra os profissionais.
Apesar de a intenção de muitos autores de trotes ser a diversão, os
policiais e bombeiros não reagem com sorrisos ao serem questionados
sobre os chamados trotes. Eles se mostram inconformados com a forma como
são tratados e com o tempo gasto ouvindo mentiras e palavrões, mesmo
quando reconhecem de imediato o modus operandi de quem está do outro lado da linha.
As crianças encabeçam a lista dos que mais passam trotes para os
serviços de emergência no Ciosp, sendo os horários de entrada e saída
das escolas o período de maior volume de ligações para o 190 e 193. Os
atendentes passam a ouvir todos os tipos expressões obscenas, dos mais
ingênuos aos mais elaborados “pedidos de socorro”.
Os adultos preferem perturbar no período noturno para levar seus
problemas aos militares. As expressões grosseiras ganham maior ênfase e,
por mais que tentem não dar atenção, os atendentes são afetados pelo
desrespeito de muitas pessoas.
“Nós começamos o serviço atendendo às ligações dizendo ‘Bombeiros.
Emergência. Bom dia’. A partir de certo momento, vamos diminuindo a
frase até resumirmos a ‘Bombeiros’, porque cansamos de gastar nossa
saudação. Nem terminamos a frase e ouvimos palavrões”, relata o sargento
do Corpo de Bombeiros Jorge Siqueira.
A cabo policial militar Jeovânia de Oliveira trabalha no serviço de
atendimento de emergência há 17 anos e atualmente supervisiona a equipe
do 190. Ela conta que o mais complicado é fazer a sociedade entender que
a Polícia Militar atende ocorrências policiais e não pacientes
psiquiátricos, por exemplo.
“O ser humano não aceita um ‘não’ da PM. As pessoas querem que as
guarnições façam transporte de parturiente, de doentes mentais em crise,
e isso nós não fazemos. As viaturas são exclusivas para ocorrência
policial”, explica a cabo, que reforça o relato dos bombeiros sobre os
trotes. “A pior parte do serviço são os trotes”, define.
A cabo Dilma Ferreira Souza Lira está há quatro meses atuando como
atendente nos terminais telefônicos do Corpo de Bombeiros Militar e já
sente o peso das ligações enganosas. Ela alerta para um fato que pode
ser o limite entre a vida e a morte.
“É estressante o fato de vermos o quanto se perde de tempo com os
trotes. E o pior é que o telefone continua chamando para outras pessoas
que estão precisando. Quando desligamos o trote e atendemos aquelas
pessoas que estão verdadeiramente ligando em busca de socorro, as
pessoas reclamam da demora, dizem que não atendemos rápido”, relata a
bombeira.
Segundo a psicóloga Janete Melo, as pessoas reagem de formas
diferentes às mesmas situações. Em exposição diária ao desrespeito no
ambiente de trabalho, alguns profissionais podem ser afetados
psicologicamente.
“Palavrões geram problemas aos profissionais porque são agressões.
Eles podem apresentar baixa altoestima, revolta, um certo relapso nas
suas atividades porque levam em conta que voltarão a atender aquela
ligação e novamente vão ouvir palavrões. Eles podem não querer atender a
ligação e, caso tenham uma atitude dessas, podem deixar de atender um
pedido de socorro”, alerta a psicóloga.
Por outro lado, Janete Melo cita a necessidade de atenção como uma
das causas da perturbação que alguns indivíduos cometem. “Algumas
pessoas querem chamar atenção dos profissionais, até pelo desejo de
estar naquele trabalho. Não querem saber o prejuízo que podem causar.
Essas pessoas talvez não tenham ocupação e procuram se ocupar causando
esses transtornos. Outra causa pode ser a falta de cultura”, elenca a
psicóloga.
Tanto os policiais quantos os bombeiros relatam casos de pessoas já
habituadas a ligar para os telefones de emergência apenas para
conversar. Eles até identificam essas pessoas pelos nomes. “D. Izaura
liga todos os dias liga para conversar. Ela aparenta ter problemas
psicológicos”, citou um dos menores aprendizes supervisionados pela cabo
Jeovânia.
Não demorou e o telefone 190 tocou com D. Izaura do outro lado da
linha. Com a voz aparentando muitos anos de vida, ela relatou viver
sozinha, sem família por perto e sem vizinhos. Disse ser Maria José da
Silva e depois falou se chamar Izaura. Confessou que liga todos os dias
para os serviços de emergência para ter com quem conversar.
“Eu ligo para o bombeiro, para a polícia, para o Samu..., pra
conversar. Eu gosto de conversar com vocês”, alegou. Ao ser perguntada
por duas vezes quantos anos tinha, mostrou-se tão lúcida quanto
incoerente: “Eu já falei que tenho 25!”. Foi melhor não contestar.
Por Blog Adalberto Gomes Notícias com Agência Alagoas
Por Blog Adalberto Gomes Notícias com Agência Alagoas
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