Alagoas: Ato de doar órgãos pode salvar vidas, afirma Secretaria de Saúde
Em 20 dias, Alagoas registrou dois casos de transplantes de múltiplos
órgãos; a atitude de duas famílias tirou nove pessoas da fila de espera
Em Alagoas, o transplante de rim, coração e córnea pode ser realizado em Maceió, na Santa Casa de Misericórdia, Hospital Artur Ramos e Hospital do Açúcar; ou no Hospital Chama, em Arapiraca Carla Cleto |
José Milson de Melo Lopes, 63 anos, é professor aposentado. Ele lida
com os números e ensina sobre a sua exatidão, mas ele também acredita
numa matemática da vida: “eu penso sempre que não temos escolha, que
ninguém vai viver eternamente”. Na verdade, o professor defende uma
única escolha, a por ser útil.
Essa valia é lembrada pelo matemático, principalmente naquele momento
de dor extrema, quando se perde um ente querido. Em situações como
essa, é possível pensar na felicidade de outras famílias por meio de um
gesto de solidariedade chamado doação de órgãos. É devido a esse ato de
bondade, que o professor está aqui agora, contando sua história.
“Eu estou vivo por causa da importância da doação de órgãos. Se não
tivesse uma mulher, de 42 anos, que sofreu um AVC e tivesse autorizado a
família a doar o fígado dela para mim, eu estaria em outro local”,
contou Milson, que descobriu a cirrose hepática (doença que conduz à
destruição do fígado) em 2012 e passou 11 meses na fila de espera para o
transplante.
“O único tratamento é o transplante de fígado”. Foi isso que o
professor Milson ouviu do médico quando agendou uma consulta com a
queixa de que sentia muito cansaço. “Eu achava que meu corpo estava
reagindo à carga horária intensa de aulas, mas, na verdade, estava com
uma doença que não conhecia e nem sabia como proceder para melhorar”,
falou. O caso foi identificado como cirrose hepática pela
esquistossomose.
O professor relatou que é realmente difícil pensar em doação de
órgãos num momento da dor. Milson lembrou que “é preciso pensar a morte
de forma natural e ter fé em Deus para agir de forma prática”. Isso
porque, segundo o professor, “quem doou deixou a minha família feliz” e
muitas outras famílias também podem ter esse sentimento. “A gente é
doador de qualquer jeito, ninguém leva nada, apenas escolhe a quem
doar”, frisou.
Milson revelou também que agradece. E isso acontece todas as noites,
quando ele se acalma e se aquieta para dormir. O professor tem um
compromisso de pedir a Deus por essa pessoa que lhe deu mais uma
oportunidade. “Até isso pesa, porque eu acredito muito no poder da
oração. Pedir a Deus por uma pessoa é muito bom, porque quando eu estava
muito ruim eu sei que pediram a Deus por mim”, lembrou.
Seu Milson até brincou, ainda que emocionado, de que Deus ouviu as
orações e deve ter pensado: “rapaz, eu acho que estão pedindo muito por
esse cara aí”. Ele contou também que sentiu a energia positiva da
família e dos alunos. “Meus alunos foram importantíssimos nesse
processo, mandando mensagem, pedindo a Deus. Isso teve muita
influência”, acrescentou.
Múltiplos órgãos - A família é fundamental no ato de doar e receber
os órgãos. “Quem doa tem a atitude de salvar outra vida ou outras vidas,
até porque uma pessoa pode doar o rim, o fígado, o coração, a córnea”,
pontuou o professor Milson. E essas vidas são salvas graças ao
transplante de múltiplos órgãos.
Segundo a assistente social da Central de Transplantes de Alagoas,
Lisieux Ferro, em 20 dias (especificamente nos dias 14 de abril e 5 de
maio de 2016), foram realizadas três entrevistas e duas famílias
aceitaram doar. O gesto de solidariedade tirou quatro pessoas da fila de
espera de rim, coração e de córnea.
“A doação de órgãos é um gesto de solidariedade que não temos como
interferir. Apenas apresentamos as diretrizes e mostramos que doar
órgãos é salvar vidas”, afirmou a assistente social. Ela informou que
Alagoas está muito distante do que se preconiza o Ministério da Saúde,
mas “juntamos todos os esforços para que as doações sejam efetivadas e a
gente possa salvar mais vidas a cada dia”.
Lisieux esclareceu que a doação é uma atitude cultural e que existe
uma dificuldade em falar e assimilar a morte, além da questão do
desapego. “Imagine, num momento de dor intensa, nós sermos capazes de
nos desprender do apego à matéria e doar os órgãos dos nossos entes.
Essa é uma marca que fica registrada e ainda multiplica a ideia de doar
órgãos e salvar vidas”, explicou.
Uma família que foi sensível à causa da doação de órgãos foi a da
dona de casa Marisa Mendes de Lima. Ela perdeu o filho, que foi
diagnosticado com morte encefálica, e contou que já tinha ouvido falar
sobre doação de órgãos pela TV, mas não sabia que essa realidade ia
chegar a ela tão rápido.
“Eu neguei num primeiro momento. Depois, conversei com o meu genro e a
minha decisão final veio com a palavra bíblica”, lembrou a dona de
casa. Ela disse ainda que não foi fácil, mas que o genro pediu para
colocar os pés no chão e ela optou por um ato de grandeza, porque é bom
ser solidário.
O professor Milson também é um multiplicador do gesto solidário de
doar órgãos. Desde que teve a oportunidade de realizar o transplante de
fígado em Recife e melhorar a saúde, ele fez uma promessa: ajudar em
duas causas - na divulgação da doação de órgãos e na educação de jovens
da escola pública para a prova do Enem.
“Por essas duas atitudes que tenho hoje, eu já recebi”, conta o
professor, que atualmente está muito bem de saúde e leva a vida
normalmente. Mas, ele ainda tem um projeto de vida, “o de participar de
uma corrida para mostrar que o transplantado é normal e se eu estou ali
correndo é porque teve alguém que olhou por mim”.
Dados - O setor de Organização e Procura de Órgãos é
o responsável pela busca ativa. Em Alagoas, o transplante de rim,
coração e córnea pode ser realizado em Maceió, na Santa Casa de
Misericórdia, Hospital Artur Ramos e Hospital do Açúcar; ou no Hospital
Chama, em Arapiraca.
Nos primeiros cinco meses do ano 2016, foram realizadas doações de 19
córneas, quatro rins e um coração. Destas doações, dois casos foram de
transplante de múltiplos órgãos. Atualmente, na fila de espera, os
alagoanos aguardam a doação de 130 córneas, 147 rins e três corações. Já
em 2015, o estado realizou a doação de 86 córneas, 10 rins e dois
corações, sendo cinco destas doações de múltiplos órgãos.
A assistente social lembrou que a maioria dos casos de morte
encefálica está ligada a eventos inesperados e é ainda diferente de
coma, que é um estado reversível. Para autorizar a doação de órgãos, a
família deve preencher o termo de declaração, que é elaborado depois da
realização do protocolo composto por três exames.
Por Blog Adalberto Gomes Notícias com Agência Alagoas
Nenhum comentário