Comunidade resiste ao tempo, ao racismo e mantém viva tradição em Alagoas
Agência Alagoas conta em série de reportagem como vive comunidade quilombola no município de Traipu
A Agência Alagoas traz à baila a partir desta reportagem uma
série de três matérias que abordará um pouco de como vive uma das
comunidades remanescentes de quilombolas no Estado.
Como se sabe, Alagoas se destaca por abrigar e ser o berço da
resistência negra no Brasil, tendo como principal líder Zumbi dos
Palmares. O principal dos quilombos está situado no município de União
dos Palmares, mas essas comunidades não se limitam apenas a esta região,
berço da liberdade negra.
Em vários quadrantes do Estado, é possível encontrar remanescentes
destes povos que muito contribuíram – e muito contribuem – para
enriquecer a cultura alagoana.
O foco desta reportagem será a comunidade quilombola Mumbaça,
localizada no município de Traipu, cidade a 143 km de Maceió, na região
Agreste.
Povoado abriga cerca de 400 famílias e já foi refúgio de escravos
“O racismo é um estigma que ainda precisamos lutar contra
diariamente”. A frase é de dona Maria José dos Santos, conhecida como
Duda, de 60 anos, que, emocionada, garante sofrer com o preconceito,
inclusive, dentro da comunidade onde vive há mais de 50 anos.
A aposentada é bisneta de escravos e considerada uma das moradoras
mais tradicionais do povoado Mumbaça, comunidade remanescente de
quilombo situada na zona rural do município de Traipu, interior de
Alagoas, a 143 km de Maceió. A região abriga cerca de 400 famílias e já
foi refúgio de escravos fugitivos ainda no século XVI.
O sustento da família de Duda vem do trabalho na roça e do
artesanato. A bisneta de escravos produz diversos bordados diferentes e
se orgulha porque aprendeu com sua mãe, quando tinha apenas dez anos de
idade. Ela conta que sua vida sempre foi muito atrapalhada. Solteira, a
dona de casa tem 11 filhos, dos quais dois morreram. “Nós ainda vivemos
em uma situação miserável aqui. Alguns dos meus filhos precisaram tentar
ganhar a vida em São Paulo, devido ao sofrimento e a falta de
oportunidade na comunidade. Aqui não tem emprego, e se quiser
sobreviver, precisa ir para a roça”, relata Duda.
A filha mais nova dela tem 16 anos e Duda revela sonhar com um futuro
diferente para a caçula. “Pelo meu sofrimento, eu não quero que ela
passe pelas mesmas coisas que eu”, diz a bisneta de escravos.
Duda destaca a discriminação que precisou vivenciar durante toda sua
vida e que ainda sofre atualmente. Segundo ela, muitos irmãos
quilombolas a intitulam como “urubu preta”. “Tem uma mulher que quando
me encontra e está chateada, grita: ‘Negro mais preto pra mim é o cão’.
Eu fico triste, mas quando estou de bom humor, deixo pra lá e, quando
não, respondo, porque eu tenho orgulho da minha cor e da minha
descendência”, conta.
”Sempre sofri com isso, desde muito nova. As pessoas não conseguem me
aceitar porque sou negra. Sou orgulhosa pela minha cor”, completa dona
Duda.
Pobreza assusta comunidade, revela descendente
Assim como a aposentada, a dona de casa Maria da Glória dos Santos,
de 46 anos, também define a atual situação da comunidade como de
'extrema miséria'. Moradora do povoado desde que nasceu e mãe de nove
filhos, ela garante que absolutamente toda a população do quilombo
Mumbaça vive de forma péssima, lutando diariamente para ter acesso aos
serviços básicos de saúde, educação e moradia. O sustento da família vem
do artesanato, trabalho na roça e com a venda da castanha, natural e
queimada.
Maria conta que, às vezes, precisa escolher quantas refeições a
família, composta por oito pessoas, vai realizar durante o dia.
Emocionada, a dona de casa garante que é triste ter que ver seus filhos e
netos com fome. “É difícil. Tem dia que só temos uma refeição e eu
preciso escolher se eles vão comer quando acordam ou quando vão dormir. O
dinheiro que nós recebemos dos programas federais é gasto totalmente
com remédios, porque as crianças adoecem com frequência. Precisamos de
mais atenção. Nós somos negros e seres humanos também, muitas vezes as
pessoas esquecem disso”, ressalta a dona de casa.
Por Blog Adalberto Gomes Noticias com Agência Alagoas
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